OPINIÃO JURÍDICA

COMO IMPLEMENTAR A TELEMEDICINA, EM TEMPOS DE CORONAVÍRUS?

No presente artigo, trataremos inicialmente do panorama histórico da Telemedicina no Brasil, para, ao final, abordarmos temas práticos para você saber como implementar a telemedicina, em tempos de Coronavírus, no seu consultório e/ou clínica médicos (especialmente nas modalidades TELECONSULTA, TELEMONITORAMENTO ou TELEVIGILÂNCIA e TELEORIENTAÇÃO), a fim de apresentar um caminho alternativo no enfrentamento da quarentena (popularmente divulgada como “isolamento social”), de modo a possibilitar e viabilizar o atendimento de novos pacientes e, principalmente, para dar continuidade aos tratamentos e atendimentos que já haviam sido iniciados anteriormente à decretação da medida.

I – EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA TELEMEDICINA NO BRASIL

I.1) PROCESSO-CONSULTA CFM nº 698/2001 PC/CFM/Nº 36/2002 – “Declaração de Tel Aviv sobre responsabilidades e normas éticas na utilização da Telemedicina” e a sua aplicação no Brasil – discutiu-se a modalidade TELEINTERCONSULTA.

A primeira vez que o CFM se debruçou sobre o tema foi no Processo-consulta nº 698/2001.

“A palavra Telemedicina foi usada pela primeira vez no início dos anos 90, na tentativa de englobar todas as várias iniciativas envolvendo a prática da Medicina ‘à distância’ pelo uso de tecnologias de comunicação.

Quem primeiramente utilizou este serviço foi o Programa Espacial da NASA, a partir do reconhecimento de que os médicos especialistas são encontrados em centros de excelência médica, na maioria das vezes distantes das localidades onde sua participação é requerida.

Tal constatação levou ao desenvolvimento, em alguns países, de uma infraestrutura piramidal na qual o Hospital-Escola ficava no ápice, suprindo a necessidade de orientação aos médicos generalistas de cidades pequenas, evitando, assim, a remoção desnecessária de pacientes e a correta administração de atendimento médico especializado.

Os projetos iniciais envolveram videoconferências, telerradiologia e as manifestações de uma ‘segunda opinião’.

Em 1988, no Massachusetts General Hospital, foi estabelecido, com sucesso, o primeiro protótipo do sistema de TELERRADIOLOGIA” (1).

Nessa consulta, o CFM evidenciou que, em 2001, a Ética e o Direito ainda não haviam dado um caminho seguro a ser trilhado, e as principais preocupações giravam em torno de como garantir os níveis mínimos de qualidade do sistema de teleassistência? Qual seria a melhor forma de garantir a confidencialidade e a segurança dos dados enviados e das recomendações recebidas? Como criar um padrão de qualidade internacional capaz de atender aos interesses dos pacientes e dos médicos do mundo inteiro?

A posição do CFM sempre foi no sentido de que “a Telemedicina traz consigo uma série de posturas que se confrontam com os princípios mais tradicionais da ética médica, principalmente no aspecto da relação médico-paciente, além de alguns problemas de ordem jurídica que podem despontar na utilização deste processo, pois ele suprime o momento mais eloquente do ato médico: a interação física do exame clínico, entre o profissional e o paciente”. (2)

Nesse cenário, torna-se de extrema relevância a análise de alguns conceitos básico trazidos pela DECLARAÇÃO DE TEL AVIV SOBRE RESPONSABILIDADES E NORMAS ÉTICAS NA UTILIZAÇÃO DA TELEMEDICINA (adotada pela 51ª Assembleia Geral da Associação Médica Mundial em Tel Aviv, Israel, em outubro de 1999).(3)

– Segundo a Declaração, “A Telemedicina é o exercício da Medicina a distância, cujas intervenções, diagnósticos, decisões de tratamentos e recomendações estão baseadas em dados, documentos e outra informação transmitida através de sistemas de telecomunicação”.

Os pacientes que não têm acesso a especialistas, ou inclusive à atenção básica, podem beneficiar-se muito com esta utilização. Por exemplo, a Telemedicina permite a transmissão de imagens médicas para realizar uma avaliação à distância em especialidades tais como radiologia, patologia, oftalmologia, cardiologia, dermatologia e ortopedia.

– A Declaração nos apresenta, também, algumas MODALIDADES de telemedicina, como a TELEASSISTÊNCIA, TELEVIGILÂNCIA, TELECONSULTA ou CONSULTA EM CONEXÃO DIRETA e TELEINTERCONSULTA, cujos conceitos e característica serão abordadas mais adiante, quando tratarmos da RESOLUÇÃO CFM nº 2.227/2018.

– Por fim, a Declaração ressalta a necessidade de obedecermos a alguns PRINCÍPIOS fundamentais:

1º) RELAÇÃO MÉDICO-PACIENTE: A Telemedicina não deve afetar adversamente a relação individual médico- paciente. Quando é utilizada de maneira correta, a Telemedicina tem o potencial de melhorar esta relação através de mais oportunidades para comunicar-se e um acesso mais fácil de ambas as partes. Como em todos os campos da Medicina, a relação médico-paciente deve basear-se no respeito mútuo, na independência de opinião do médico, na autonomia do paciente e na confidencialidade profissional. É essencial que o médico e o paciente possam se identificar com confiança quando se utiliza a Telemedicina.

2º) RESPONSABILIDADES DO MÉDICO: O médico tem liberdade e completa independência de decidir se utiliza ou recomenda a Telemedicina para seu paciente. A decisão de utilizar ou recusar a Telemedicina deve basear-se somente no benefício do paciente. Quando utilizar a Telemedicina diretamente com o paciente, o médico assume a responsabilidade do caso em questão. Isto inclui o diagnóstico, opinião, tratamento e intervenções médicas diretas.

3º) RESPONSABILIDADE DO PACIENTE: Em algumas situações, o paciente assume a responsabilidade da coleta e transmissão de dados ao médico, como nos casos de televigilância. É obrigação do médico assegurar que o paciente tenha uma formação apropriada dos procedimentos necessários, que é fisicamente capaz e que entende bem a importância de sua responsabilidade no processo. O mesmo princípio se deve aplicar a um membro da família ou a outra pessoa que ajude o paciente a utilizar a Telemedicina.

4º) CONSENTIMENTO E CONFIDENCIALIDADE DO PACIENTE: As regras correntes do consentimento e confidencialidade do paciente também se aplicam às situações da Telemedicina. A informação sobre o paciente só pode ser transmitida ao médico ou a outro profissional de saúde se isso for permitido pelo paciente com seu consentimento esclarecido. A informação transmitida deve ser pertinente ao problema em questão. Devido aos riscos de filtração de informações inerentes a certos tipos de comunicação eletrônica, o médico tem a obrigação de assegurar que sejam aplicadas todas as normas de medidas de segurança estabelecidas para proteger a confidencialidade do paciente.

5º) QUALIDADE DA ATENÇÃO E SEGURANÇA NA TELEMEDICINA: O médico que utiliza a Telemedicina é responsável pela qualidade da atenção que recebe o paciente e não deve optar pela consulta de Telemedicina, a menos que considere que é a melhor opção disponível. Para esta decisão o médico deve levar em conta a qualidade, o acesso e o custo.

6º) QUALIDADE DA INFORMAÇÃO: O médico que exerce a Medicina à distância sem ver o paciente deve avaliar cuidadosamente a informação que recebe. O médico só pode dar opiniões e recomendações ou tomar decisões médicas se a qualidade da informação recebida é suficiente e pertinente para o cerne da questão.

7º) AUTORIZAÇÃO E COMPETÊNCIA PARA UTILIZAR A TELEMEDICINA: A Telemedicina oferece a oportunidade de aumentar o uso eficaz dos recursos humanos médicos no mundo inteiro e deve estar aberta a todos os médicos, inclusive através das fronteiras nacionais. O médico que utiliza a Telemedicina deve estar autorizado a exercer a Medicina no país ou estado onde reside e deve ser competente na sua especialidade.

8º) HISTÓRIA CLÍNICA DO PACIENTE: Todos os médicos que utilizam a Telemedicina devem manter prontuários clínicos adequados dos pacientes e todos os aspectos de cada caso devem estar documentados devidamente.

– Deve-se registrar:

i) o método de identificação do paciente e também a quantidade e qualidade da informação recebida.

ii) os achados, recomendações e serviços de Telemedicina utilizados e se deve fazer todo o possível para assegurar a durabilidade e a exatidão da informação arquivada.

I.2) RESOLUÇÃO CFM nº 1.643/2002 – foi a PRIMEIRA norma do CFM a definir e disciplinar a prestação de serviços através da Telemedicina.(4)

Após a consulta feita ao CFM, restou claro do seu parecer (reitera-se, emitido em 2001) que a presente iria servir de base para a necessária exposição de motivos e a fundamentação de uma futura resolução, que, de fato, veio a ser editada em 2002.

Alicerçada na DECLARAÇÃO DE TEL AVIV, SOBRE RESPONSABILIDADES E NORMAS ÉTICAS NA UTILIZAÇÃO DA TELEMEDICINA, abordada no item anterior, a RESOLUÇÃO CFM nº 1.643/2002 definiu a Telemedicina como sendo “o exercício da Medicina através da utilização de metodologias interativas de comunicação audio-visual e de dados, com o objetivo de assistência, educação e pesquisa em Saúde”.

Apresentando normas gerais de aplicação da Telemedicina, a Resolução se baseia, então, nos princípios e modalidades apresentados pela Declaração de Tel Aviv, supracitada.

I.3 – RESOLUÇÃO CFM Nº 2.107/2014 – Definiu e normatizou a TELERRADIOLOGIA.(5)

A segunda norma sobre Telemedicina editada pelo CFM veio em 2014, com a edição da RESOLUÇÃO CFM Nº 2.107/2014.

Nesta norma, o CFM tratou especificamente da Telerradiologia, possibilitando a prática de transmissão de imagens radiológicas de pacientes entre diferentes locais para a produção de um relatório médico, uma segunda opinião de especialista ou uma revisão clínico-radiológica; locais estes que podem estar dentro da mesma organização ou em organizações diferentes.

A Telerradiologia, como uma modalidade da TELEINTERCONSULTA, foi prevista para as situações onde o fator crítico é a distância, utilizando as tecnologias de informação e de comunicação para o envio de dados e imagens radiológicas com o propósito de emissão de relatório, como suporte às atividades desenvolvidas localmente.

Nessa modalidade, o CFM destaca que, na emissão do RELATÓRIO, deverá constar o número do registro profissional médico, nos respectivos Conselhos Regionais de Medicina do Brasil, dos médicos envolvidos no atendimento e da pessoa jurídica prestadora de serviço remoto, quando houver.

Observamos o surgimento de algumas ORIENTAÇÕES PRÁTICAS para a transmissão e o manuseio dos exames e laudos, no que tange ao FORMATO DOS ARQUIVOS a serem transmitidos, de acordo com o nível de complexidade dos exames, como demonstraremos a seguir:

– Nível 1: Radiologia Geral não contrastada [por exemplo, radiografias de tórax, extremidades, colunas, crânio, e outros], exceto mamografia.

Nesse caso, os exames deverão ser transmitidos em formato JPEG, com resolução mínima de 4 Megapixel ou DICOM 3.

– Nível 2: Radiologia Especializada ou Contrastada

Aqui, os exames deverão ser transmitidos em formatos JPEG, com resolução mínima de 4 Megapixel ou DICOM 3, sob a responsabilidade de médico especialista com registro no CRM.

– Nível 3: Tomografia Computadorizada, Ressonância Magnética, Medicina Nuclear.

Os exames deverão ser transmitidos em formato DICOM 3, sob a responsabilidade de médico especialista com registro no CRM.

– Nível 4: Mamografia Digital (CR ou DR).

Os exames deverão ser transmitidos em formato DICOM 3, sob a responsabilidade de médico com registro no CRM. A análise dos exames deverá ser feita em monitor específico.

O formato JPEG é mais utilizado para imagens em geral. A resolução mínima de 4  Megapixel, conseguem atender às necessidades de exames que não demandam uma visualização em mais de 2 (duas) dimensões. O ponto mais relevante desse formato está no tamanho do arquivo gerado, que ocupa pouquíssimo espaço de armazenamento nos computadores, tablets ou celulares.

Já o formato DICOM (sigla para Digital Imaging and Communications in Medicine – Comunicação de Imagens Digitais em Medicina), embora também possibilite o acesso das informações nos dispositivos móveis supracitados, ocupa mais espaço de armazenamento que o formato JPEG. São arquivos relativamente grandes, ultrapassando facilmente 500 MB. Todavia, sua principal característica é o fatiamento do objeto escaneado em três eixos, que podem ser juntados e fazer um arquivo 3D.

I.4 – RESOLUÇÃO CFM nº 2.227/2018 – Definiu e disciplinou a TELEMEDICINA como forma de prestação de serviços médicos mediados por tecnologias.(6)

Essa Resolução foi a norma que melhor definiu a telemedicina, abordando suas diversas modalidades e formas de aplicação.

De fato, foi uma grande evolução da temática em nosso país. Porém, tal norma foi REVOGADA em 2019, pela Resolução CFM nº 2.228/2019, em virtude do alto número de propostas encaminhadas pelos médicos e entidades médicas brasileiros para alteração dos seus termos.

Não obstante a sua revogação, como a matéria (Telemecidina) foi trazida novamente ao debate nacional, em razão da pandemia causada pela COVID-19, vamos abordá-la em razão dos seus preciosos conceitos e premissas, que em muito serão úteis nesse momento.

Inicialmente, é importante ressaltar as modalidades de Telemedicina trazidas pela RESOLUÇÃO CFM nº 2.227/2018: TELECONSULTA, TELEINTERCONSULTA, TELEDIAGNÓSTICO, TELECIRURGIA, TELETRIAGEM, TELEMONITORAMENTO, TELEORIENTAÇÃO e TELECONSULTORIA.

A) TELECONSULTA: é “a consulta médica remota, mediada por tecnologias, com médico e paciente localizados em diferentes espaços geográficos”.

Como premissa obrigatória estava o prévio estabelecimento de uma relação presencial entre médico e paciente.

Para atendimentos por longo tempo ou em caso de doenças crônicas, recomendou-se a consulta presencial em intervalos não superiores a 120 dias.

Também era premissa dessa modalidade o consentimento do paciente ou de seu representante legal, e realização por livre decisão e sob responsabilidade profissional do médico.

Um ponto relevante pro nosso debate foi a previsão de alguns requisitos obrigatórios, trazidos no art. 5º da Resolução, quais sejam:

Nas Teleconsultas são obrigatórios os seguintes registros eletrônicos/digitais:

I – identificação das instituições prestadoras e dos profissionais envolvidos;

II – termo de consentimento livre e esclarecido;

III – identificação e dados do paciente;

IV – registro da data e hora do início e do encerramento;

V – identificação da especialidade;

VI – motivo da Teleconsulta;

VII – observação clínica e dados propedêuticos;

VIII – diagnóstico;

IX – decisão clínica e terapêutica;

X – dados relevantes de exames diagnósticos complementares;

XI – identificação de encaminhamentos clínicos;

XII – produção de um RELATÓRIO que contenha toda informação clínica relevante, validado pelos profissionais intervenientes e armazenado nos Sistemas de Registro Eletrônico/Digital das respectivas instituições; e

XIII – encaminhamento ao paciente de cópia do relatório, assinado pelo médico responsável pelo teleatendimento, com garantia de autoria digital.

B) TELEINTERCONSULTA: é a troca de informações e opiniões entre médicos, com ou sem a presença do paciente, para auxílio diagnóstico ou terapêutico, clínico ou cirúrgico.

Nessa modalidade, a responsabilidade profissional do atendimento cabe ao médico assistente do paciente. Os demais médicos envolvidos responderão solidariamente na proporção em que contribuírem para eventual dano.

C) TELEDIAGNÓSTICO: é o ato médico a distância, geográfica e/ou temporal, com a transmissão de gráficos, imagens e dados para emissão de laudo ou parecer por médico com Registro de Qualificação de Especialista (RQE) na área relacionada ao procedimento.

Deve ser realizado segundo diretrizes científicas propostas pela Associação de Especialidade vinculada ao método, reconhecida pela Comissão Mista de Especialidades, constituída conforme Decreto no 8.516, de 10 de setembro de 2015, excetuando-se os procedimentos regulamentados por resolução específica do CFM (como a Telerradiologia e a Telepatologia).

D) TELECIRURGIA: Também é tratada pela Resolução, no art. 8º.

E) TELETRIAGEM: é o ato realizado por um médico com avaliação dos sintomas, à distância, para definição e direcionamento do paciente ao tipo adequado de assistência que necessita ou a um especialista. Inclusive, está sendo adotada pelo SUS para os casos de COVID-19.

O médico deve destacar e registrar que não se trata de um diagnóstico médico.

F) TELEMONITORAMENTO ou TELEVIGILÂNCIA: é o ato realizado sob orientação e supervisão médica para monitoramento ou vigilância a distância de parâmetros de saúde e/ou doença, por meio de aquisição direta de imagens, sinais e dados de equipamentos e/ou dispositivos agregados ou implantáveis nos pacientes em regime de internação clínica ou domiciliar, em comunidade terapêutica, em instituição de longa permanência de idosos ou no translado de paciente até sua chegada ao estabelecimento de saúde.

O telemonitoramento inclui a coleta de dados clínicos, sua transmissão, processamento e manejo sem que o paciente precise se deslocar até uma unidade de saúde.

G) TELEORIENTAÇÃO: é o ato médico realizado para preenchimento a distância de declaração de saúde e para contratação ou adesão a plano privado de assistência à saúde.Nessa modalidade, são vedadas indagações a respeito de sintomas, uso de medicamentos e hábitos de vida.

H) TELECONSULTORIA: é o ato de consultoria mediada por tecnologias entre médicos e gestores, profissionais e trabalhadores da área da saúde, com a finalidade de esclarecer dúvidas sobre procedimentos, ações de saúde e questões relativas ao processo de trabalho.

Por fim, vale ressaltar que a Resolução assegurada ao médico a liberdade e completa independência de decidir se utiliza ou recusa a telemedicina, indicando a consulta presencial sempre que entender necessário.

A RESOLUÇÃO CFM nº 2.227/2018 foi além de meramente trazer as modalidades de Telemedicina. Disciplinou temas EXTREMAMENTE importantes para o contexto atual:

– PRESCRIÇÃO MÉDICA À DISTÂNCIA: Disciplinou a possibilidade de a prescrição médica ser feita à distância, trazendo os elementos obrigatórios que nela devem constar:

I – identificação do médico, incluindo nome, CRM e endereço;

II – identificação e dados do paciente;

III – registro de data e hora;

IV – assinatura digital do médico ou outro meio legal que comprove a veracidade do documento.

Previu, ainda, em seu art. 17, a possibilidade de emissão de PARECER À DISTÂNCIA, em caso de emergência ou quando solicitado pelo médico responsável. Nesse caso, o médico que emitir o parecer à distância poderá prestar o devido suporte diagnóstico e terapêutico.

– TCLE (Termo de Consentimento Livre e Esclarecido): Outro ponto tratado foi a necessidade de o paciente (ou seu representante legal) autorizar a transmissão das suas imagens e dados por meio de consentimento informado, livre e esclarecido, por escrito e assinado, ou de gravação da leitura do texto e concordância, devendo fazer parte do Sistema de Registro Eletrônico/Digital do teleatendimento ao paciente.

Ainda tratou da necessidade de se assegurar o consentimento explícito, no qual o paciente deve estar consciente de que suas informações pessoais podem ser compartilhadas e sobre o seu direito de negar permissão para isso.

Portanto, como se observa de todo o até aqui exposto, a RESOLUÇÃO CFM nº 2.227/2018 foi inovadora e, não obstante a sua revogação pela Resolução CFM nº 2.228/2019, entendemos que pode ser utilizada como fonte de interpretação e aplicação das normas ora vigentes sobre a Telemedicina (aprovadas pelo Ministério da Saúde – e que serão analisadas adiante).

I.5 – RESOLUÇÃO CFM Nº 2.264/2019 – Definiu e disciplinou a TELEPATOLOGIA como forma de prestação de serviços de anatomopatologia mediados por tecnologias.(7)

Continuando nossa digressão histórica acerca da implantação da Telemedicina no ordenamento jurídico brasileiro, vale citar que, em 2019, o CFM editou a RESOLUÇÃO CFM Nº 2.264, definindo a TELEPATOLOGIA como o exercício da especialidade médica em patologia mediado por tecnologias para o envio de dados e imagens com o propósito de emissão de relatório, como suporte às atividades anatomopatológicas desenvolvidas localmente.

Importante destacar aqui que, na Telepatologia, a transmissão dos exames deve ser acompanhada dos dados pessoais e clínicos do paciente, da macroscopia da peça e das imagens das lâminas, sob responsabilidade de médico com Registro de Qualificação de Especialista (RQE) no Conselho Regional de Medicina de sua jurisdição, para elaboração de laudo ou relatório.

O paciente deverá autorizar a transmissão das suas imagens de lâminas e dados por meio de consentimento informado, livre e esclarecido.

– CONCEITOS IMPORTANTES:

Telepatologia – é o exercício de diagnóstico anatomopatológico ou citológico, por médicos patologistas e/ou citopatologistas, em imagens digitais capturadas com auxílio de equipamentos que reproduzam integralmente lâminas de amostras de tecidos ou células.

Capturadores de imagens ou scanners de lâminas – são equipamentos que, por meio de câmeras, digitalizam imagens sequenciais montando uma lâmina virtual que represente com fidelidade a lâmina física. Tais aparelhos devem ser homologados pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) quando necessário.

Solicitação virtual – é o conjunto de informações clínicas, imagens de microscopia, exames complementares e lâmina(s) virtual(is), encaminhadas digitalmente, com finalidade de laudo ou relatório médico.

Lâmina virtual – é a imagem digital de lâmina de histopatologia, citopatologia, imuno-histoquímica, patologia molecular ou outros espécimes utilizados para diagnóstico médico.

Prazo de armazenamento das lâminas virtuais: As lâminas virtuais utilizadas em procedimentos diagnósticos devem ser guardadas por no mínimo 3 (três) meses. Após esse tempo deve ser guardada imagem digital da lâmina física que comprove sua autenticidade. A guarda das imagens é de responsabilidade dos serviços que as utilizam. A guarda da lâmina física permanece seguindo a legislação vigente.

I.6 – PORTARIA MS Nº 467, DE 20 DE MARÇO DE 2020 – Dispôs, em caráter excepcional e temporário, sobre as ações de TELEMEDICINA, com o objetivo de regulamentar e operacionalizar as medidas de enfrentamento da emergência de saúde pública, decorrente da epidemia de COVID-19.(8)

Com o reconhecimento, pela OMS, da pandemia causada pela COVID-19, os países tiveram que adaptar suas medidas de saúde à realidade imposta pela doença.

No Brasil, tivemos a edição da PORTARIA MS nº 467/2020 pelo Ministério da Saúde, impulsionada por um ofício expedido pelo Conselho Federal de Medicina (Ofício CFM nº 1756/2020-Cojur de 19 de março de 2020), no qual reconheceu a “possibilidade e a eticidade da utilização da Telemedicina, em caráter de excepcionalidade e enquanto durar as medidas de enfretamento ao coronavírus (COVID-19)”.(9)

Destarte, a presente Portaria regulamentou as ações de Telemedicina de interação à distância, passando a contemplar o ATENDIMENTO PRÉ-CLÍNICO, de SUPORTE ASSISTENCIAL, de CONSULTA, MONITORAMENTO e DIAGNÓSTICO, por meio de tecnologia da informação e comunicação, como demonstraremos no próximo tópico.

II – COMO IMPLEMENTAR A TELEMEDICINA?

As ações de Telemedicina de interação à distância, como dissemos, podem contemplar o ATENDIMENTO PRÉ-CLÍNICO, de SUPORTE ASSISTENCIAL, de CONSULTA, MONITORAMENTO e DIAGNÓSTICO, por meio de tecnologia da informação e comunicação, no âmbito do SUS, bem como na saúde suplementar e privada.

Na verdade, estamos nos referindo aqui às MODALIDADES de Telemedicina regulamentadas pela RESOLUÇÃO CFM nº 2.227/2018, quais sejam, TELETRIAGEM, TELEORIENTAÇÃO, TELECONSULTA e TELEINTERCONSULTA, TELEMONITORAMENTO (ou TELEVIGILÂNCIA) e TELEDIAGNÓSTICO, já mencionadas no item 4 acima, para onde remetemos o caro leitor.

Como dito, embora tenha sido revogada, entendemos que a RESOLUÇÃO CFM nº 2.227/2018 é muito elucidativa e nos traz o embasamento teórico que o momento exige, uma vez que não há norma do CFM, até o momento, disciplinando a matéria.

O Teleatendimento trazido pela PORTARIA Nº 467/2020, do Ministério da Saúde (MS), deverá ser efetuado diretamente entre médicos e pacientes, por meio de tecnologia da informação e comunicação que garanta a integridade, segurança e o sigilo das informações.

Como dispõe a norma do MS, os médicos que participarem das ações de Telemedicina, deverão empregar esse meio de atendimento com objetivo de reduzir a propagação do COVID-19 e proteger as pessoas, devendo:

I – atender aos preceitos éticos de beneficência, não-maleficência, sigilo das informações e autonomia; e

II – observar as normas e orientações do Ministério da Saúde sobre notificação compulsória, em especial as listadas no Protocolo de Manejo Clínico do Coronavírus (COVID-19), disponível no endereço eletrônico do Ministério da Saúde.

II.1) IMPORTÂNCIA DO PRONTUÁRIO NO ATENDIMENTO POR TELEMEDICINA:

O atendimento realizado pelo médico ao paciente por meio da Telemedicina, terá que ser, obrigatoriamente, registrado em PRONTUÁRIO clínico, que deverá conter (para cada paciente):

1º) Os dados clínicos necessários para a boa condução do caso, sendo preenchido em cada contato com o paciente;

2º) em ordem cronológica, a data, hora e tecnologia da informação e comunicação utilizada para o atendimento; e

3º) a assinatura e o número do Conselho Regional Profissional e sua unidade da federação.

O PRONTUÁRIO do paciente será, portanto, ferramenta indispensável no teleatendimento. Por isso, entendemos que o mesmo deverá permanecer sob a guarda do médico ou da instituição que assiste o paciente, conforme resoluções do CFM que tratam do prontuário médico.(10)

Deverá ser registrados no prontuário, portanto, quais dados foram avaliados pelo médico (como imagens, vídeos, gravações de som, laudos de exames etc.) e a forma como estes dados foram transmitidos e avaliados pelo médico (por exemplo, por chamada telefônica, e-mail, aplicativos de mensagens, ou outros meios de comunicação).

Ademais, as cópias dos dados avaliados durante o atendimento deverão ser guardadas junto ao prontuário.

II.2) ATESTADO E RECEITAS por TELEMEDICINA:

Os médicos poderão, no âmbito do atendimento por Telemedicina, emitir atestados ou receitas médicas em meio eletrônico, devendo obedecer a, pelo menos, 1 (um) dos seguintes requisitos de validade, a seguir:

1º) Uso de assinatura eletrônica, por meio de certificados e chaves emitidos pela Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira – ICP-Brasil;

2º) Uso de dados associados à assinatura do médico de tal modo que qualquer modificação posterior possa ser detectável; OU

3º) Atendimento dos seguintes requisitos:

a) identificação do médico;

b) associação ou anexo de dados em formato eletrônico pelo médico (ex.: foto de receita, assinada e encaminhada pelo médico por via eletrônica); e

c) ser admitida pelas partes como válida ou aceita pela pessoa a quem for oposto o documento.

– Quais são as INFORMAÇÕES INDISPENSÁVEIS que deverão constar no ATESTADO: O atestado médico deverá conter, no mínimo, as seguintes informações:

I – identificação do médico, incluindo nome e CRM;

II – identificação e dados do paciente;

III – registro de data e hora;

IV – duração do atestado; e

V – forma de comunicação através da qual o paciente foi avaliado

– Quais os REQUISITOS para a emissão da RECEITA: A prescrição da receita médica observará os requisitos previstos em atos da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa).

– Determinação da MEDIDA DE ISOLAMENTO: No caso de medida de isolamento determinada por médico, caberá ao paciente enviar ou comunicar a ele:

I – Termo de consentimento livre e esclarecido; e

II – termo de Declaração, contendo a relação dos contactantes.

II.3) REMUNERAÇÃO:

Os serviços prestados nas modalidades de telemedicina serão remunerados conforme acordado entre o médico e seu contratante, pessoa física ou jurídica.

Os serviços médicos prestados através de Operadoras de Plano de Saúde, Cooperativas e congêneres, serão remunerados conforme acordos entre os profissionais médicos e tais entidades, enquanto não houver regulamentação pela ANS.

II.4) PRINCIPAIS DÚVIDAS E DICAS PRÁTICAS:

A) Qual plataforma utilizar? Aquela que garanta a INTEGRIDADE, a SEGURANÇA e o SIGILO DAS INFORMAÇÕES.

Para TELECONSULTA E TELEMONITORAMENTO: pode-se utilizar, por exemplo, aplicativos como o ZOOM(11), SKYPE e assemelhados. Importante destacar, contudo, que, segundo orientações do CRM-MG (expedidas em 21/03/2020) e, no mesmo sentido, conforme Parecer CFM nº 14/2017(12), o WhatsApp NÃO preenche os pré-requisitos para essas modalidades de Telemedicina.

TELEORIENTAÇÃO: segundo essas mesmas recomendações, o WhatsApp PODE ser utilizado para TELEORIENTAÇÃO.

B) Como fazer a identificação do paciente? Solicitando o envio eletrônico de DOCUMENTO com FOTO, por exemplo.

C)Tenho que GRAVAR o atendimento? Não há essa obrigatoriedade, porém, recomendamos – principalmente para registro do consentimento e demais declarações do paciente.

D) Como devo REGISTRAR o atendimento? Como já dito anteriormente, o atendimento deve ser registrado em PRONTUÁRIO clínico, que deverá conter: I – dados clínicos que foram avaliados pelo médico em cada contato com o paciente (como imagens, vídeos, gravações de som, laudos de exames etc.), II – data, hora e a forma como estes dados foram transmitidos e avaliados pelo médico (por exemplo, por chamada telefônica, e-mail, aplicativos de mensagens, ou outros meios de comunicação), III – o nome, número do Conselho Regional Profissional e sua unidade da federação.

E) Posso utilizar a telemedicina para a PRIMEIRA CONSULTA? SIM. Como já dito anteriormente e, desde que a critério do médico assistente, não seja imprescindível a realização de exame físico para conclusão diagnóstica e terapêutica.

F) A Telemedicina pode ser feita por quaisquer ESPECIALIDADES? SIM. Qualquer especialidade pode realizar as modalidades de teleatendimento.

G) Só pode ser feita para PACIENTES PARTICULARES? NÃO. SUS, saúde suplementar e pacientes particulares.

H) Posso COBRAR pelo teleatendimento? SIM. Como já abordado acima:

PACIENTES PARTICULARES: A negociação é livre entre as partes. SERVIÇO PÚBLICO: A negociação deverá ocorrer entre os médicos e os gestores de saúde.

PACIENTES CONVENIADOS: O pagamento será regulamentado pela ANS com a operadora do plano de saúde. Enquanto não acontece, pode o médico pactuar diretamente com a operadora.

A ANS emitiu recomendação às operadoras(13) para que providenciem as adequações necessárias em suas redes para disponibilizarem atendimento remoto aos beneficiários, utilizando recursos de tecnologia da informação e comunicação, na forma prevista nas resoluções dos respectivos conselhos de profissionais de saúde e na portaria editada pelo Ministério da Saúde. A reguladora também orienta as operadoras a disponibilizarem aos seus clientes canais de atendimento específicos para prestar esclarecimentos e informações sobre o Coronavírus.

I) Posso emitir ATESTADO e RECEITA à distância? SIM. Ver requisitos na norma supracitada.

J) Como fica a questão do RETORNO do paciente? Ele terá direito? SIM. O “retorno” ou reavaliação do atendimento deverá respeitar a necessidade de cada caso e não poderá ser cobrado.

Conforme RESOLUÇÃO CFM 1958/2010(14), a  CONSULTA  MÉDICA  compreende  a  anamnese,  o  exame  físico  e  a elaboração    de    hipóteses    ou    conclusões    diagnósticas,    solicitação    de    exames complementares, quando necessários, e prescrição terapêutica como ATO MÉDICO COMPLETO e que pode ser concluído ou não em um único momento.

Quando  houver  necessidade  de  exames  complementares  que  não  possam  ser apreciados  nesta  mesma  consulta,  o  ato  terá  continuidade  para  sua  finalização,  com tempo determinado a critério do médico, NÃO GERANDO COBRANÇA DE HONORÁRIO.

Mesmo  dentro  da  hipótese  prevista  no  parágrafo  1º,  existe  a  possibilidade  do atendimento de distinta doença no mesmo paciente, o que caracteriza NOVO ATO PROFISSIONAL passível de cobrança de novos honorários médicos.

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REFERÊNCIAS:

(1) PROCESSO-CONSULTA CFM nº 698/2001 PC/CFM/Nº 36/2002, disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/arquivos/ pareceres/BR/2002/36_2002.pdf.

(2) idem.

(3) Disponível em: http://portal.cfm.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=20096: responsabilidades-e-normas-eticas-na-utilizacao-da-telemedicina&catid=46.

(4) Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/ resolucoes/BR/2002/1643.

(5) Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/ resolucoes/BR/2014/2107.

(6) Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/ resolucoes/BR/2018/2227.

(7) Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/ resolucoes/BR/2019/2264.

(8) Disponível em: http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-467 -de-20-de-marco-de-2020-249312996.

(9) Disponível em: http://portal.cfm.org.br/images/PDF/2020_oficio _telemedicina.pdf.

(10) Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/ resolucoes/BR/2002/1638.

(11) Consulte: https://www.zoom.us.

(12) Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/ pareceres/BR/2017/14.

(13) Disponível em: http://www.ans.gov.br/aans/noticias-ans/consumidor/5454-coronavirus-ans-reforca-orientacoes-a-beneficiarios-de-planos-de-saude-durante-pandemia.

(14) Disponível em: https://sistemas.cfm.org.br/normas/visualizar/ resolucoes/BR/2010/1958.

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